17 FEV 2025
ESTÚDIOS VICTOR CÓRDON
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Em destaque, a essência do que se transmite, esse gesto singular entre quem entrega e quem recebe.
Lançamento da Programação
Vindos de um ano cuja programação se propôs refletir a partir do mote "O Mundo é a Casa do Corpo”, trazendo para o centro da ação ideias relativas às comunidades migrantes residentes em Portugal, a par de outras interculturalidades transversais a toda a programação, urgia agora pensar para onde direcionar os vários caminhos abertos, e, com eles, pensar a essência do que se transmite, esse gesto singular entre quem entrega e quem recebe.
Sendo verdade que caminhar é estar mais perto de um lugar, é também verdade que, à medida que se avança, aumenta a distância do local de origem. Por outro lado, e por nem sempre serem os que partem os mesmos que chegam, o caminho pressupõe um processo de transmissão. Porventura reflexo de um tempo em que comemoramos 50 anos de Liberdade, em contraciclo com uma forte tendência de amnésia coletiva, cujo avanço vai apagando o ímpeto desse momento original, terminámos 2024 com a redobrada consciência da necessidade de dar a conhecer o passado, revistando-o e dando-lhe novas leituras. Nesse exercício de conhecimento e reconhecimento pela ação dos que nos antecederam reside uma poderosa força motriz, capaz de defender e alargar as conquistas civilizacionais alcançadas ao longo dos tempos.
Em 1884, o chão que agora pisamos foi casa do Real Ginásio Clube Português, que aqui permaneceu aproximadamente durante um século, antes da chegada da Companhia Nacional de Bailado, que neste lugar cresceu e se consolidou ao longo de aproximadamente três décadas. Neste espaço, que é o da prática do corpo, queremos prestar reconhecimento, em parceria com o atual Ginásio Clube Português, a esse movimento fundador que nos antecedeu, dando a conhecer as imagens de arquivo desses primeiros atletas, que neste mesmo lugar procuravam a excelência física e, sem o saberem, abriam caminho para um acesso democrático e livre de pessoas às instituições. Para isso, comunicaremos cada ação e ideia da programação de 2025 através dos corpos distantes e em movimento desses pioneiros e pioneiras, confirmando que a decisão de superação é intemporal e inerente à condição humana.
Não sendo o presente matéria objetiva, menos o será o passado, cuja perceção nos chega da transmissão escrita e oral. Sobre esta perceção, construímos as várias narrativas que sustentam o que pensamos individual e coletivamente. É precisamente desta subjetividade que surge a necessidade de revisitação de locais, eventos e personagens que constituem as nossas narrativas históricas, perspetivando-as à luz do presente.
Apostando no aprofundamento do espírito colaborativo em processos de criação, da TEMPORADA 2025 destacamos o programa Jovens Compositores, que conta com a habitual coordenação do compositor, agora Prémio Pessoa, Luís Tinoco e com a cocoordenação da libretista e mezzo-soprano Marcia Belamy, do dramaturgo Stephan Plaice e do coreógrafo Victor Hugo Pontes. Durante o programa, ampliam-se novas possibilidades aos criadores e intérpretes participantes, envolvendo as áreas artísticas da composição, escrita e coreografia.
Ainda em janeiro, assistimos também à estreia do espetáculo Sensorianas, da autoria de Clara Andermatt, dedicado à cultura persa, no âmbito do novo programa Outros Mundos, que elegeu este ano o Irão como país em foco. Depois da sua estreia no Teatro Camões em Lisboa, rumou a Guimarães (onde foi apresentado no contexto do GUIdance — Festival Internacional de Dança Contemporânea), Aveiro (Teatro Aveirense), Viseu (Teatro Viriato) e Loulé (Cineteatro Louletano), englobando várias ações em escolas em parceria com o Plano Nacional das Artes (PNA). Simultaneamente, os artistas convidados para o programa Em Casa, Sofia Dias & Vítor Roriz, iniciam uma presença comemorativa dos seus 20 anos de atividade, oferecendo-nos uma programação que ressalta a temática proposta, ocupando estúdios, corredores, o foyer, salas, pisos e recantos dos EVC ao longo de todo o ano.
De regresso em fevereiro estará Carlota Lagido, com uma nova curadoria para o Ciclo de Exposições cérebro, olhos, mãos e papel, que acontecem em continuidade durante todo ano, no foyer dos EVC. Aqui, receberemos propostas de artistas da dança que têm uma ligação às artes visuais, tais como Flávio Rodrigues, Miguel Bonneville e Ana Caetano.
Ao longo de todo o ano, continuaremos a ser local de acolhimento para artistas em Residências Artísticas de criação na área da dança, assim como para os festivais de dança que nos propõem criadores participantes nas suas programações através do programa Em Trânsito. As práticas diárias e complementares para profissionais da dança também se estendem ao longo de todo o ano, contando com Tiago Martins no programa Treino EVC, em abril, e com Pedro Ramos e João Cardoso no programa Kick-Off '25, em setembro, após o período estival.
Com o Dia Mundial da Dança, chega-nos o programa Bailar o Mundo, que, em parceria com o Observatório do Mundo Islâmico, nos traz diferentes danças praticadas em encontros sociais. Um espaço para conhecer e dançar ao ritmo de outras culturas com as quais desde sempre interagimos.
Voltamos, já na sua 8ª edição, ao programa Território, cujo principal objetivo é apoiar o início de carreira de jovens bailarinos e bailarinas provenientes de escolas de dança de todo o país. Este ano, vamos conhecer uma nova criação do coreógrafo Nadav Zelner e uma peça do coreógrafo Marco Goecke. Este programa entra agora num novo ciclo que contempla estágios de aperfeiçoamento artístico, fruto da parceria estabelecida entre os EVC e o Nederlands Dans Theater, permitindo a jovens bailarinos usufruírem de uma experiência multidisciplinar. Em 2025, iniciaremos também estágios equivalentes com a Companhia Nacional de Bailado, consolidando assim uma plataforma de contacto entre instituições de renome e jovens em fase de profissionalização.
Nesta jornada de revisão do passado, olhando-o a partir de uma outra conceção do mundo, chegam-nos em outubro os Encontros para o Futuro VII, com a conferência performativa da autoria de Joana Craveiro Que bem posso escusar trazer escrito em papel o que na alma andar devia, sobre esse argonauta-navegador chamado Luís de Camões. Esta edição está integrada no ciclo comemorativo do 5º centenário do nascimento de Camões.
No último trimestre de 2025, teremos um programa sobre a ação no gesto de transmissão e reflexão de criadores, intitulado Palavras e Práticas. Na primeira edição, contamos com a presença do coreógrafo e bailarino Marco da Silva Ferreira. Durante um dia estruturado com uma componente prática e uma teórica, serão dados a experimentar processos de criação, aproximando comunidade artística e público em geral. Já a iniciativa Artista em Residência, realizada em parceria com o Plano Nacional das Artes (PNA), irá levar a escolas do ensino público duas coreógrafas participantes no programa Jovens Compositores de 2024: Beatriz Valentim e Joana Franco.
Por fim, o programa PALOP 25 desdobrar-se-á em dois eixos: residência artística, formação e desenvolvimento de projeto a partir de uma nova colaboração com a Ordem do Ó, direcionados a artistas da dança provenientes da Guiné-Bissau, e encontros e desenvolvimento de projeto em colaboração com o artista David Marques, direcionados a coreógrafos de Moçambique, dando continuidade a um conjunto de colaborações que mantemos desde 2020 com países de língua portuguesa em África.
Agradecendo a todos os parceiros e pessoas que por aqui passam ao longo do ano, termino com as mesmas palavras de 2024:
Lançamos esta programação sabendo que o caminho pode moldar as intenções, tornando-a mais adequada às necessidades de quem dela pode usufruir, e, sendo certo que nem todas as propostas chegam ao ponto onde à partida as imaginamos, quando movidas por um espírito criativo e conciliador, serão seguramente portadoras de mudança.
É no chão que pisamos que propomos encontrar-nos.
Rui Lopes Graça,
fevereiro de 2025
Fotografia
(c) Ginásio Clube Português | Outubro de 1925 - Abertura das aulas na época 1925-26.
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