Um bailarino que não sabia dançar, um cantor que não sabia cantar, um ator que não sabia atuar, um escritor que não sabia escrever, um pintor que não sabia pintar. Um bailarino que cantava, um escritor que pintava, um ator que escrevia. Era preciso saber-se fazer para se saber ser. Enquanto as linhas ténues que separam o ser do fazer, o eu da ação, a coisa do sujeito, são confusas, há algo que permanece inapto e disfuncional. Um monstro que não cumpre a função.
Está visto (Interlúdio lírico, 2023) é o título provisório de uma nova peça a solo de João dos Santos Martins em colaboração com a pianista e compositora Joana Sá e a artista visual Ana Jotta. A partir do ciclo de canções Dichterliebe [Amor de poeta] compostas por Robert Schumann em 1840, a peça apresenta-se em formato de recital, procurando que as práticas do canto, de tocar piano e da dança interajam e transbordem umas para as outras.
As canções de estilo romântico com poesia de Heinrich Heine falam de amor não correspondido. Esta falta de reciprocidade das emoções é reproduzida na ideia da dança que se desarticula da linguagem através do gesto, fracionando entre ressonância e dissonância com as letras das canções e o som.
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